segunda-feira, 27 de setembro de 2010

20/09/2010

CARTA ABERTA DOS ADOLESCENTES DO NORDESTE CONTRA TOQUE DE RECOLHER

Os adolescentes que participaram do Seminário Regional do Nordeste, promovido pelo Fórum Nacional de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, em Salvador (BA), apresentaram uma Carta Aberta contra o toque de recolher. O tema foi discutido durante o seminário, que contou com cerca de 300 participantes, entre eles 60 adolescentes.

No documento, os adolescentes argumentam que o toque de recolher "é uma medida paliativa e ilusória, que objetiva esconder os problemas no lugar de resolvê-los". A seguir a íntegra da Carta Aberta.


Salvador, 18 de setembro de 2010


Os adolescentes da Região Nordeste do Fórum Nacional DCA, reunidos no Seminário Regional do Plano Decenal do Nordeste, em Salvador (BA), vêm se colocar contra o procedimento denominado Toque de Recolher - proibição de circulação de crianças e adolescentes nas ruas no período noturno-, adotado em algumas cidades do País, por meio de portarias de Juízes da Infância e Juventude.

O Toque de Recolher contraria o ECA e a Constituição Federal. É uma medida paliativa e ilusória, que objetiva esconder os problemas no lugar de resolvê-los. As medidas e programas de acolhimento, atendimento e proteção integral estão previstas no ECA, sendo necessário que o Poder Executivo implemente os programas;

O Estatuto da Criança e do Adolescente é claro: “Qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.

Será que nossos juízes e vereadores não conhecem casos como das crianças no interior do Ceará que trabalham quebrando pedras? O menor tem apenas oito anos e já sente o peso da marreta. As crianças mostram os dedos machucados de tanto quebrar pedras. No bairro Novo Mauriti, em Mauriti (CE), existem em torno de 250 moradores e pelo menos 15 famílias trabalham quebrando pedras.

Será que não conhecem o Brasil para saber que esta realidade se repete em Pernambuco nas lavouras de cana-de-açúcar, no Pará e em vários locais do País? Se querem de fato proteger nossas crianças, por que então não implementam o toque de recolher para os donos das pedreiras e usineiros do Nordeste?

Onde estão os conselheiros tutelares nesta ocasião? Também é comum nas grandes cidades vermos famílias inteiras morando nas ruas, inclusive com crianças de colo recém-nascidas. Como também é comum famílias trabalharem nas ruas com crianças puxando carroças enormes cheias de ferro, latinhas e papelão retirados do lixo para garantirem sua sobrevivência. Quanto a essa negligência, nossos juízes nada dizem! Vão resolver o problema também tirando todos os pobres e mendigos das ruas?

Por fim, certamente seria um grande favor à sociedade e um grande ato de proteção às nossas crianças e adolescentes se o poder judiciário utilizasse sua força para por na cadeia os verdadeiros culpados por toda a violência, negligência, crueldade e opressão contra as crianças e o povo; os políticos corruptos que recebem propina das grandes empreiteiras; os promotores do trabalho escravo; as multinacionais que roubaram o patrimônio público; os traficantes de drogas graúdos que aliciam nossos menores. Mas para estes não é proposto nenhum toque de recolher!

Desta forma, é necessário ficarmos de olho aberto e esclarecermos a juventude e o povo para a mentira e hipocrisia que representa essa proposta do toque de recolher. Não podemos permitir que a sociedade seja enganada e manipulada por pessoas que querem esconder os verdadeiros problemas sociais e seus culpados e a violência causada pelo capitalismo.


Adolescentes do Nordeste - Brasil

Fonte:www.forumdca.org.br

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Plano Nacional de Direitos Humanos 3

Entidades se reúnem para debater implantação do PNDH-3

20/09/2010

Nos dias 27 e 28 de agosto, Brasília (DF) foi palco de um momento importante na defesa dos direitos humanos. Durante esses dois dias aconteceu a 4º Assembleia Ordinária da Plataforma Dhesca Brasil. O encontro teve o objetivo de debater os temas de atuação da rede e a forma de intervenção da Plataforma no cenário dos direitos humanos. Participaram entidades filiadas e parceiras. No dia 26 de agosto, foi realizado um Seminário, promovido por diversas organizações e redes que fazem parte da Campanha pela integralidade e implementação do PNDH-3, sobre o monitoramento da implementação do Programa.

Durante a assembléia da Plataforma, foram debatidas estratégias de monitoramento e exigibilidade dos direitos, como as Relatorias Nacionais de Direitos Humanos e diversos temas como: criminalização das mulheres que praticam o aborto, o impacto do racismo nas políticas educacionais, a educação religiosa nas escolas, sistema prisional, o impacto das grandes no meio-ambiente e nos direitos das populações afetadas, entre outros assuntos. “Justamente os que são ou serão atingidos não tem voz ativa contra esses grandes projetos”, ressaltou Alexandre Ciconello, assessor de Direitos Humanos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e membro da coordenação da Plataforma Dhesca.

Foram escolhidas as organizações que irão compor a coordenação da Plataforma Dhesca nos próximos dois anos. São elas: Inesc; Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea); Justiça Global; Rede Feminista de Saúde; e Terra de Direitos. Além disso, foram debatidas as principais estratégias para o próximo Plano Trienal e aprovadas três novas filiadas: Sociedade Maranhense de Direitos; e o Dom da Terra.

No seminário sobre o PNDH, realizado dia 26 de agosto, o governo federal se comprometeu a apresentar, até 10 de dezembro, um Plano de Ação Bianual para a implementação do PNDH 3, programa que estabelece objetivos, diretrizes e ações programáticas às políticas de direitos humanos no país. O Plano de Ação será construído pelo Comitê de Acompanhamento e Monitoramento, colegiado interministerial responsável em identificar metas prioritárias, definir indicadores de monitoramento e promover a articulação entre os órgãos e entidades envolvidos. Esse será o primeiro PNDH que contará com um Plano de Ação e com um Comitê de Acompanhamento.

O seminário teve a participação de representantes de diversos ministérios e da Secretaria de Direitos Humanos, que apresentou a proposta de funcionamento do Comitê. De acordo com Lena Peres – Subsecretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da SDH – nesse ano acontecerão mais quatro reuniões entre os 21 ministérios e secretarias nomeados para compor o Comitê, sendo uma delas nessa quinta-feira (2). Durante a primeira reunião do colegiado, realizada no dia 18 de agosto, todos os nomeados compareceram, com exceção do Ministério das Comunicações, que não justificou a ausência.

A participação da sociedade civil no acompanhamento e monitoramento da implementação do PNDH 3 é garantido através do decreto que instituiu o PNDH (7037/09). Durante o seminário, os representantes das redes e organizações expuseram a necessidade de garantir a participação social no processo de monitoramento, instituindo um comitê autônomo para a sociedade civil. A proposta apresentada foi a de que os encontros da sociedade civil aconteçam um dia antes das reuniões do Comitê governamental, com a possibilidade de um momento específico para que os atores discutam conjuntamente as prioridades. Esse modelo já foi adotado para a realização da Conferência Nacional de Direitos Humanos, onde a sociedade civil teve papel central na organização do evento.


Para saber mais, acesse: www.pndh3.com.br e www.dhescbrasil.org.br

Fonte: www.abong.org.br

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

França aprofunda xenofobia

Walter Hupsel

Por Walter Hupsel . 16.09.10 - 13h50

O ovo da serpente

Certa feita, na Alemanha, depois de uma década de convulsão social e de um parlamentarismo que não funcionava direito, o presidente Paul von Hindenburg se viu numa sinuca de bico e resolveu tentar agregar a direita nomeando Adolf Hitler chanceler.

Não era nenhuma novidade o antissemitismo de Hitler (professava-o publicamente e já tinha escrito “Mein Kampf”), muito menos suas ideias para a Alemanha. A pretensão de Hindenburg de controlar o pintor austríaco foi um retumbante fracasso, e sabemos o que aconteceu com a Alemanha e o mundo até o fim da Segunda Guerra Mundial.

A pergunta feita ao longo das décadas é como isso foi possível, principalmente na Alemanha, país tido como o mais culturalmente desenvolvido naquela época. Várias respostas foram dadas, e pelo menos duas se tornaram instantaneamente clássicas: A da “Dialética do Esclarescimento”, de Adorno e Horkheimer, e “As Origens do Totalitarismo”, de Hannah Arendt.

Apesar de visões opostas, são textos completentares. Enquanto Arendt faz um levantamento da irracionalidade do Estado nazista, com um organograma tão confuso que fazia o subordinado ter medo e, por isso, obedecer toda e qualquer ordem, Adorno e Horkheimer ressaltavam justamente a racionalidade instrumental do nazismo, fruto da moderna ciência da administração, que levada ao extremo produziu corpos com o menor custo possível, e se questionaram onde o projeto de civilização teria traído as suas promessas a ponto de se tornar o oposto do que prometia ser.

A lógica nazista, racional e quase asséptica, foi responsável pelo assassinato direto de cerca de seis milhões de pessoas, basicamente judeus, mas também comunistas, homossexuais, deficientes físicos e mentais, e… ciganos.

Hoje, 65 anos depois, do outro lado do Reno, na França de Paris, que um dia esteve na vanguarda ao proclamar os direitos do homem, que foi ocupada por Hitler, e na França de Vichy, do entreguista General Pétain, que substitui o lema da Revolução Francesa pelo “Trabalho, Família e Pátria”, estão mimetizando, em escala menor, o ódio ao outro, o ódio ao migrante, o ódio ao cigano, e estão expulsando-os.

O governo francês se perde em justificativas espúrias ao dizer que o que estão fazendo é o simples combate à imigração ilegal. O argumento já caiu por terra. Uma circular do governo francês vazou e nela estava explicitada qual deveria ser o grupo étnico preferencial das ações da polícia: os ciganos.

O marco legal é confuso. Oriundos da Romênia e da Bulgária, os romas são cidadãos europeus, e, portanto, têm direito ao livre trânsito na Europa. Ao mesmo tempo é permitido ao Estado extraditar aqueles europeus que, após três meses de residência, não tenham nem endereço fixo e nem trabalho.

É nessa zona cinzenta que se move o governo Sarkozy ao se utilizar do argumento do desemprego. Ocorre que, mesmo se fosse verificado como fato (para isso seriam necessárias provas contundentes de que todos, e cada um, não têm nem emprego e nem residência fixa), a expulsão, ou, eufemisticamente, extradição, só poderia ser feita individualmente.

Pelos documentos vazados, fica claro que é uma política do governo francês expulsar, ops, extraditar todos os romas. De julho até agora já foram “extraditadas” mais de mil pessoas, e 300 acampamentos ciganos são os alvos.

Baseada no Direito Comunitário, a Comissão Européia já advertiu a França e afirmou que pode abrir processo contra o país caso a decisão de expulsão não seja revista e imediatamente suspensa. Parece, assim, haver uma clara identificação por parte do governo Sarkozy dos ciganos como párias, como indesejados.

Não faz muito tempo, escrevi neste mesmo espaço sobre como era absurda a proibição da burca em locais públicos, e tentei mostrar que esta era apenas uma face da xenofobia pela qual o governo francês tem enveredado. A atual decisão de expulsão daqueles que pertencem à etnia roma só reforça meu argumento.

Sarkozy está, por conta de problemas da política interna, conduzindo a França por um caminho perigosíssimo, de radicalização da direita, de estímulo ao ódio e à xenofobia. Ao tentar agradar este eleitorado, que cresce quase que metastaticamente em todo o velho continente, o marido de Carla Bruni desvia o foco das suspeitas de corrupção em seu governo, alimenta temores e oxigena o medo, que encontra terreno fértil nesta Europa do século 21.

O PP, partido conservador espanhol que abriga quadros do franquismo, está distribuindo panfletos, nos arredores de Barcelona, pregando a expulsão dos ciganos de lá.

A União Europeia parece ter, por enquanto, escapado da crise financeira que ameaçava a sua unidade. Mas há outras ameaças e a xenofobia é, provavelmente, a principal delas. Se não houver ações enérgicas das instâncias responsáveis, este belo projeto de união, de uma possibilidade pós-nacional estará morto e em breve.

E isso não é o pior. Deixo, como conclusão, um trecho do poema “No caminho com Maiakóvsky”, do poeta carioca Eduardo Alves Costa:

Na primeira noite eles se aproximam/e roubam uma flor/do nosso jardim./E não dizemos nada./Na segunda noite, já não se escondem;/pisam as flores,/matam nosso cão,/e não dizemos nada./Até que um dia,/o mais frágil deles/entra sozinho em nossa casa,/rouba-nos a luz, e,/conhecendo nosso medo,/arranca-nos a voz da garganta./E já não podemos dizer nada.

P.S. Para quem quer ver o avanço da ultra-direita européia e da xenofobia, assista a “Fitna”, um vídeo de Geert Wilders, político holandês antimuçulmano.. Se espremer, sai ódio e sangue. Assista: parte 1 e parte 2.

Fonte: www.yahoo.com.br

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Semiárido em transição



Diário do Nordeste
Valéria Feitosa - Editora do Regional
12/09/2010

A convivência com o semiárido ainda é um desafio a vencer. Lançado há mais de 10 anos por uma mobilização da sociedade civil organizada, por meio da Articulação do Semiárido (ASA), o paradigma ainda se coloca na ordem do dia, lançando sobre as comunidades sertanejas e governos a sentença da mitológica Esfinge: "decifra-me ou devoro-te".

Nesta peleja entre vida e morte, observa-se uma fase de transição entre dois modelos: no primeiro, estão famílias desmobilizadas, "vítimas da seca", à espera da água da emergência, a grande maioria. No segundo, as comunidades mobilizam-se por meio de Organizações Não Governamentais (ONGs), pastorais sociais da Igreja Católica, Sindicatos de Trabalhadores Rurais. São protagonistas do próprio destino e descobrem formas de conviver com a aridez do sertão, utilizando tecnologias apropriadas à região. Estas ainda são minoria.

A cisterna de placas para captar água de chuva é o símbolo da convivência com o semiárido. Mas também tem a cisterna de calçadão, o Projeto Mandala, a barragem subterrânea e, agora, a cisterna "Chapéu do Padre Cícero", desenvolvida por uma comunidade de Nova Olinda, que combina as três primeiras técnicas.

É sabido que em todo segundo semestre de cada ano, a estiagem é uma certeza no semiárido brasileiro. Nos períodos em que as chuvas se precipitam abaixo da média histórica, como observa-se em 2010, a estiagem configura-se como seca, prenunciada em seca verde já nos primeiros seis meses do ano. Os prejuízos na agricultura e na pecuária são inevitáveis.

O Ceará chega em pleno setembro somente com média de 66% de sua capacidade total de reserva hídrica. Até dezembro, a escassez de água só tende a aumentar. Para mostrar como as populações rurais estão enfrentando a seca, o Diário do Nordeste traz esta edição especial do Caderno Regional, resultado das viagens de mais de 6 mil quilômetros, entre idas e vindas, por mais de 50 municípios feitas por oito repórteres e correspondentes.

As matérias traduzem como agricultores, donas de casa, crianças, jovens, pequenos produtores vivem neste velho sertão novo. São questões antigas de escassez de água convivendo com estratégias novas para superar o problema. Estas estratégias, em muitos casos, ainda são pontuais. E vem a contradição: a cisterna de placa, lançada para libertar o sertanejo da emergência dos governos, precisa do carro-pipa oficial para ter água. Para muitas famílias que ainda não podem ser protagonistas da própria história, a cisterna de placa ainda não provou sua real eficácia.

Porém, são nas manifestações pontuais do povo do sertão que os repórteres também puderam constatar que o paradigma de convivência com o semiárido é uma realidade viável. O funcionamento do Projeto Mandala, um verdadeiro oásis no sertão, prova ser possível superar, ao menos em parte, as dificuldades da seca. Tanto é assim que fatos inusitados acontecem: o pequeno produtor "Zé Padre" cultiva morango em plena Nova Olinda, a partir da ampliação da cisterna.

O mais incrível é perceber, pelos olhos dos repórteres, a criatividade de muitos sertanejos para superar as adversidades da estiagem. Que o diga o agricultor Aldemir Mendes, do Município de Independência, que, para evitar o calor e a aridez do solo na plantação, construiu cultivos suspensos em canteiros improvisados dentro de carcaças de geladeira.

É a convivência com o semiárido sendo recriada pela ação de muitos josés, marias, joões, que mostram ser possível brotar a vida na região em suas mais variadas manifestações. O antigo padrão do flagelo da seca toma novos contornos. Além da sociedade civil organizada, governos também entram no cenário com aportes públicos, a exemplo de programas como Garantia Safra e Bolsa Família.

E o semiárido segue sua fase de transição e só o tempo dirá quando será o final. O velho sertão novo tem ainda muitas famílias desmobilizadas, algumas choram diante da falta d´água, mas também tem comunidades protagonistas que, diante da sentença da Esfinge, escolhem decifrar os mistérios da Caatinga e conviver com ela na perspectiva da sustentabilidade.

Fonte: www.asabrasil.org.br

terça-feira, 14 de setembro de 2010

OPINIÃO: Plataforma por um marco regulatório para as organizações da sociedade civil

A ABONG e suas associadas têm como bandeira de luta histórica a criação de um marco legal para as organizações da sociedade civil, tendo inclusive formulado uma proposta de Projeto de Lei que está disponível em nossa página na internet (www.abong.org.br). A formulação de um marco regulatório que torne as relações entre as organizações e o Estado mais claras e transparentes não é uma demanda somente nossa, mas sim de um leque de instituições que enxergam de forma semelhante essa necessidade.

Para aproveitar o momento de debate político colocado pelo período eleitoral, uma articulação de entidades, entre elas a ABONG e a Fundação Esquel, formularam a Plataforma por um Novo Marco Regulatório Para as Organizações da Sociedade Civil. A Plataforma, que pode ser lida aqui, recebeu diversas adesões e foi enviada às(aos) candidatas(os) na última sexta-feira, 10 de setembro. Seu objetivo é colocar a discussão do marco legal para as(aos) candidatas(os) à presidência da República, apresentando à elas(eles) as demandas e reivindicações de um setor tão fundamental para a democracia brasileira.

As associadas à ABONG vêm discutindo sistematicamente a questão da sustentabilidade política e financeira do campo que reúne ONGs e movimentos sociais que lutam por direitos, participação política e pela implantação de um modelo de desenvolvimento social e ambientalmente justo, não calcado no consumo e na exploração de bens naturais.

Grande parte das organizações deste campo enfrentam hoje grandes dificuldades para permanecer existindo. Uma pesquisa feita pela ABONG revela que 92% das suas associadas sofreram um corte de mais de 30% do seu orçamento entre 2004 e 2008, e 42% mais de 50% de redução. Essa situação decorre em parte da saída e/ou diminuição de recursos da cooperação internacional, que exercia até então um papel preponderante no financiamento, inclusive institucional, dessas organizações.

A maior lacuna é justamente por uma legislação que amplie o conceito de interesse público e regulamente o acesso aos fundos públicos com base em critérios transparentes e democráticos. A sua ausência reduz o papel das ONGs à execução de políticas governamentais, em condições extremamente restritivas: regras na administração dos financiamentos similares à da economia de mercado, burocracia e demora no repasse de recursos, ausência de apoio institucional. Favorece ainda o desvio de recursos públicos por governantes que incentivam a criação de organizações fictícias, e acaba manchando a imagem de organizações sérias e comprometidas com a transformação social. Assim, acreditamos que a implementação de um marco regulatório para as organizações da sociedade civil é fundamental para transformar essa situação.

Fonte: www.abong.org.br

Crescimento no Brasil não pode passar por cima de direitos, diz ONU

Por Leonardo Sakamoto

Genebra - Conversei na manhã de hoje com a armênia Gulnara Shahinian, relatora especial da Organização das Nações Unidas para as Formas Contemporâneas de Escravidão, que passou duas semanas no Brasil a fim de produzir um relatório que será apresentado na tarde desta terça (14) na reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Disse que verificou um verdadeiro reconhecimento do problema pelo governo brasileiro e o comprometimento de setores sociais, políticos e econômicos com sua erradicação. Segundo ela, “o país está fazendo e aprendendo com isso. Mas há muito que fazer ainda”.

Para a relatora, o peso das questões econômicas deve ser considerado, mas o debate sobre desenvolvimento e crescimento precisa levar em conta os impactos causados por eles. Avalia que o Brasil pode se tornar a quinta maior economia do mundo, mas isso não pode ser feito à custa dos direitos das pessoas.

Para Gulnara, há mais “inspiração” para o combate ao trabalho escravo no nível federal de governo do que no nível local. Segundo ela, o país é imenso e se faz necessário que os mesmos processos que levaram a conquistas no nível federal cheguem ao âmbito estadual com a introdução de políticas públicas. Por exemplo, deveria ser obrigatório que todos os estados tivessem planos para combater a escravidão e os executassem – hoje, Maranhão, Piauí, Tocantins, Pará, Mato Grosso e Bahia possuem planos, além do Plano Nacional, mas nem todos cumprem o que prometeram.

Ela afirma, em suas conclusões, que “as ações exemplares correm o risco de serem ofuscadas se ações urgentes não forem tomadas para quebrar o ciclo de impunidade de que gozam proprietários de terra, empresas nacionais e internacionais, e intermediários (como os contratadores de mão-de-obra, conhecidos como “gatos”) que se beneficiam do trabalho escravo”.

Um exemplo disso é uma atuação mais forte junto a aprovação de leis, fator necessário para institucionalizar esses processos. Para Gulnara, a mensagem mais clara que o governo brasileiro pode dar para mostrar que o crime será punido é aprovar a Proposta de Emenda Constitucional 438/2001, que permitiria o confisco das terras onde houvesse trabalho escravo.

Destaco algumas das conclusões e recomendações da relatora:

- Pobreza é a principal causa da escravidão. Nesse sentido, mais atenção deve ser dada a erradicação da pobreza. Neste contexto, desenvolvimento local e reforma agrária devem ser priorizados. Programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e reinserção de trabalhadores devem ser priorizados para essas populações em áreas urbanas e rurais;

- Programas que garantam direitos básicos, como alimentação, saneamento, saúde e educação, devem ser implementados para fornecer uma reabilitação sustentável das vítimas e sua integração na vida econômica. O governo brasileiro também deve aumentar os programas em educação em direitos humanos voltados a trabalhadores libertos ou em áreas vulneráveis;

- Aqueles que defendem os direitos humanos no Brasil têm sido ameaçados, feridos e mortos. Ela sugere o fortalecimento do corpo policial para garantir proteção a estas pessoas e combater a impunidade;

- Reformas legislativas são necessárias para prevenir a reincidência, como o aumento da pena mínina de dois para cinco anos de cadeia a quem incorreu nesse crime. A incorporação de algumas conquistas como lei também foi sugerida, a exemplo da “lista suja” do trabalho escravo (que relaciona quem cometeu esse crime) e a própria existência do grupo móvel de fiscalização (que verifica denúncias e liberta pessoas);

- Reforçar a competência da Justiça Federal para julgar o crime de trabalho escravo, previsto em decisão do Supremo Tribunal Federal de novembro de 2006. Para ela, o governo também deve atuar para trazer todas as graves violações aos direitos humanos para a esfera federal, seguindo as recomendações feitas pelo Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas;

- O governo precisa investir recursos para dar apoio às vítimas de tráfico de seres humanos, como a criação de abrigos e apoio legal. Também deve dar apoio financeiro para as vítimas recuperarem e reconstruírem suas vidas ;

- Ela ressalta que graças ao trabalho do governo, sociedade civil e setor empresarial, a escravidão não está presente em todos os setores econômicos no país. Ela encoraja empresas a aderirem ao Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que reúne companhias que aceitaram atuar contra esse crime em suas cadeias produtivas,

- A relatora reconhece o importante papel desempenhado pela Organização Internacional do Trabalho nesse processo e sugere ao governo dividir o exemplo do sistema de combate ao trabalho escravo com outros países da America Latina.

Em tempo: fui convidado para representar a sociedade civil brasileira em um debate sobre o tema nesta quarta aqui nas Nações Unidas. Depois trago as impressoes.

FONTE: blogdosakamoto.uol.com.br


segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O que é assédio moral ?

Assédio moral ou violência moral no trabalho não é um fenômeno novo. Pode-se dizer que ele é tão antigo quanto o trabalho.

A novidade reside na intensificação, gravidade, amplitude e banalização do fenômeno e na abordagem que tenta estabelecer o nexo-causal com a organização do trabalho e tratá-lo como não inerente ao trabalho. A reflexão e o debate sobre o tema são recentes no Brasil, tendo ganhado força após a divulgação da pesquisa brasileira realizada por Dra. Margarida Barreto. Tema da sua dissertação de Mestrado em Psicologia Social, foi defendida em 22 de maio de 2000 na PUC/ SP, sob o título "Uma jornada de humilhações".

A primeira matéria sobre a pesquisa brasileira saiu na Folha de São Paulo, no dia 25 de novembro de 2000, na coluna de Mônica Bérgamo. Desde então o tema tem tido presença constante nos jornais, revistas, rádio e televisão, em todo país. O assunto vem sendo discutido amplamente pela sociedade, em particular no movimento sindical e no âmbito do legislativo.

Em agosto do mesmo ano, foi publicado no Brasil o livro de Marie France Hirigoyen "Harcèlement Moral: la violence perverse au quotidien". O livro foi traduzido pela Editora Bertrand Brasil, com o título Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.

Atualmente existem mais de 80 projetos de lei em diferentes municípios do país. Vários projetos já foram aprovados e, entre eles, destacamos: São Paulo, Natal, Guarulhos, Iracemápolis, Bauru, Jaboticabal, Cascavel, Sidrolândia, Reserva do Iguaçu, Guararema, Campinas, entre outros. No âmbito estadual, o Rio de Janeiro, que, desde maio de 2002, condena esta prática. Existem projetos em tramitação nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Paraná, Bahia, entre outros. No âmbito federal, há propostas de alteração do Código Penal e outros projetos de lei.

O que é humilhação?

Conceito: É um sentimento de ser ofendido/a, menosprezado/a, rebaixado/a, inferiorizado/a, submetido/a, vexado/a, constrangido/a e ultrajado/a pelo outro/a. É sentir-se um ninguém, sem valor, inútil. Magoado/a, revoltado/a, perturbado/a, mortificado/a, traído/a, envergonhado/a, indignado/a e com raiva. A humilhação causa dor, tristeza e sofrimento.

E o que é assédio moral no trabalho?

É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego.

Caracteriza-se pela degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e a organização. A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos pares. Estes, por medo do desemprego e a vergonha de serem também humilhados associado ao estímulo constante à competitividade, rompem os laços afetivos com a vítima e, freqüentemente, reproduzem e reatualizam ações e atos do agressor no ambiente de trabalho, instaurando o ’pacto da tolerância e do silêncio’ no coletivo, enquanto a vitima vai gradativamente se desestabilizando e fragilizando, ’perdendo’ sua auto-estima.

Em resumo: um ato isolado de humilhação não é assédio moral. Este, pressupõe:

  1. repetição sistemática
  2. intencionalidade (forçar o outro a abrir mão do emprego)
  3. direcionalidade (uma pessoa do grupo é escolhida como bode expiatório)
  4. temporalidade (durante a jornada, por dias e meses)
  5. degradação deliberada das condições de trabalho

Entretanto, quer seja um ato ou a repetição deste ato, devemos combater firmemente por constituir uma violência psicológica, causando danos à saúde física e mental, não somente daquele que é excluído, mas de todo o coletivo que testemunha esses atos.

O desabrochar do individualismo reafirma o perfil do ’novo’ trabalhador: ’autônomo, flexível’, capaz, competitivo, criativo, agressivo, qualificado e empregável. Estas habilidades o qualificam para a demanda do mercado que procura a excelência e saúde perfeita. Estar ’apto’ significa responsabilizar os trabalhadores pela formação/qualificação e culpabilizá-los pelo desemprego, aumento da pobreza urbana e miséria, desfocando a realidade e impondo aos trabalhadores um sofrimento perverso.

A humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador e trabalhadora de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental*, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte, constituindo um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho.

A violência moral no trabalho constitui um fenômeno internacional segundo levantamento recente da Organização Internacional do Trabalho (OIT) com diversos paises desenvolvidos. A pesquisa aponta para distúrbios da saúde mental relacionado com as condições de trabalho em países como Finlândia, Alemanha, Reino Unido, Polônia e Estados Unidos. As perspectivas são sombrias para as duas próximas décadas, pois segundo a OIT e Organização Mundial da Saúde, estas serão as décadas do ’mal estar na globalização", onde predominará depressões, angustias e outros danos psíquicos, relacionados com as novas políticas de gestão na organização de trabalho e que estão vinculadas as políticas neoliberais.

(*) ver texto da OIT sobre o assunto no link: http://www.ilo.org/public/spanish/bureau/inf/pr/2000/37.htm

Fonte: BARRETO, M. Uma jornada de humilhações. São Paulo: Fapesp; PUC, 2000 e www.assediomoral.org

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Lei 12318/10: Alienação Parental

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a alienação parental.

Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

II – dificultar o exercício da autoridade parental;

III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;

V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Art. 3º A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.

Art. 4º Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.

Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica
da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.

Art. 5º Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial.

§ 1º O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.

§ 2º A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

§ 3º O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.

Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:

I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;

II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;

III – estipular multa ao alienador;

IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;

V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;

VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;

VII – declarar a suspensão da autoridade parental.

Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.

Art. 7º A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada.

Art. 8º A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de decisão judicial.

Art. 9º ( VETADO)

Art. 10. (VETADO)

Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 26 de agosto de 2010; 189o da Independência e 122º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto
Paulo de Tarso Vannuch