segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Criança, Adolescente e Eleições na Bahia

MOVIMENTO SOCIAL DE CRIANÇA E ADOLESCENTE DEVE PAUTAR AS CANDIDATURAS BAIANAS: ALGUMAS REFLEXÕES

ANTONIO MARCOS SANTOS*

As eleições deste ano na Bahia colocam um desafio enorme para as entidades que militam no movimento de criança e adolescente no Estado: como pautar as candidaturas governamentais e parlamentares na perspectiva delas assumirem o compromisso de fazerem cumprir uma agenda em prol da garantia do direito da criança e do adolescente como prioridade absoluta, conforme o ECA, lei de 1990, que tem 25 anos de existência em nosso país?

Em primeiro lugar, é necessário uma leitura sobre a realidade das políticas governamentais desenvolvidas nos últimos 4 (quatro) anos pelo governo do PT. Sem dúvida nenhuma podemos citar avanços importantes: o orçamento do Fundo Estadual da Criança e do Adolescente – FECRIANÇA – saltou de R$ 120 mil reais anuais para R$ 1 milhão; a agenda do enfrentamento ao trabalho infantil ganhou corpo; as políticas sociais e culturais foram mais interiorizadas; as medidas sócio-educativas avançaram com a criação de Unidades de Semi-liberdades em regiões estratégicas do Estado; o semi-árido baiano ocupou um espaço maior nas preocupações do Estado, já que esta região é onde apresenta menor IDH; os Conselhos Tutelares conseguiram serem universalizados, juntamente com os Conselhos de Direitos; temos uma maior descentralização do orçamento estadual; o Plano de Educação em Direitos Humanos representa um avanço; o governo tem um diálogo mais respeitoso com o movimento social, além de outras conquistas. Reconhecer estes avanços nos faz também perceber onde devemos avançar e nos indica como devemos centrar nossa estratégia de ação para garantir a prioridade absoluta da criança e do adolescente. Isto é com certeza os motivos do segundo ponto deste texto.

Em segundo lugar, precisamos mostrar claramente os pontos que precisam avançar:

1 – O orçamento do FECRIANÇA ainda é muito pequeno para a dimensão geográfica do nosso estado e também o déficit social acumulado ao longo das décadas de governos que priorizavam obras faraônicas em detrimento da melhoria da qualidade de vida da população. Neste sentido, é essencial também apontarmos para a necessidade de criarmos um marco regulatório de financiamento das entidades não governamentais no estado da Bahia, pois entidades não governamentais não podem continuar sendo tratadas como “ou caso de polícia” ou “empresas”;

2 – O CECA (Conselho Estadual da Criança e do Adolescente) precisa se transformar, em um conselho estadual no sentido de conseguir ser o espaço formulador da política estadual da criança e do adolescente, inclusive colocando nesta política as diferenças culturais, geográficas e sociais que é característico de nossa realidade e ajudando no fortalecimento dos conselhos municipais e conselhos tutelares, órgãos locais e, portanto mais próximo da realidade diária das pessoas; além disto, o CECA precisa ser o espaço de avanço no sentido de contribuir na socialização da política numa perspectiva de controle social do Estado. Por fim, o CECA necessita também ser espaço que fomente a articulação e a integração e intersetorialidade das políticas públicas sociais no Estado;

3 - É essencial a redefinição do papel da Segurança Pública no nosso estado, mudando a lógica de atuação deste aparelho tão essencial para a paz social. A Segurança Pública precisa ser refeita a partir de outras bases, já que a atual ainda vê os pobres como perigosos e ainda criminaliza movimentos sociais, negros, moradores de periferia e juventude. O movimento da criança e do adolescente precisa ajudar a construir um Plano Estadual de Segurança Pública, que supere a visão preconceituosa apontada acima e que conceba a Segurança Pública como direito social e que está a serviço do coletivo e não contra ele. A Polícia não pode mais achar que seu trabalho só é eficaz quando mata e que o salário do bandido é o seu extermínio. A Polícia precisa ser formada dentro de outros parâmetros educacionais que veja que sua ação tem como limite a lei e que a lei é o caminho de punição para os que se desviam dos padrões socialmente aceitos de convivência. Combater a pena de morte legalizada no Brasil pela Polícia deve ocupar espaço importante no Plano de Segurança Estadual. Há de ressaltar ainda que um Plano de Segurança Pública deve ser fundado também numa compreensão de que a violência na contemporaneidade é resultado das contradições da forma em que estamos produzindo o existir agora, ou seja, a violência deve ser explicada não como simplesmente um desvio moral dos cidadãos, mas como a ponta do iceberg da operacionalização do sistema sócio-econômico no atual estágio da humanidade. No bojo da Segurança pública devem-se ampliar as delegacias especializadas de criança e adolescente, hoje somente duas existentes no Estado. A implantação de delegacias deve ser seguida por um Plano de formação de agentes da segurança pública para lidar com a criança e adolescente de uma forma a cumprir o seu papel sem desrespeitar os seus direitos. Estamos vendo no dia a dia uma transferência de responsabilidade da Segurança Pública para os Conselhos Tutelares, que se transformaram até em policiais não oficializados. A Policia tem que estar preparada para desenvolver na área de infância e adolescência a sua função a partir do ECA.

4 – Garanti direitos exige que a Instância que atua no cumprimento da lei de fato exista na prática, principalmente daqueles que mais necessitam da Instituição. Criar varas da Infância e da Adolescência no Estado é alargar as condições para que o ECA se cumpra em nosso Estado. Precisamos deixar de ser somente 2 (duas) varas especializadas em criança e do adolescente na Bahia e termos a Justiça da Infância em nossos municipios, porque isto com certeza ajudará na priorização do julgamento de ilegalidade cometidas seja pelo Estado ou por pessoas contra o direito da criança e do adolescente. Hoje, os processos judiciais envolvendo criança e adolescente não são priorizados na pauta do Judiciário e assim o sistema de impunidade se perpetua e o sentimento de violação permanece latente nos violadores, já que muitos dos seus crimes preescrevem;

5 – O trabalho infantil precisa ser enfrentado com mais veemência pelo Estado, inclusive com financiamento de ações para os municípios que mostrarem mais resultados nesta área. O PETI hoje é municipalizado e as prefeituras ainda não conseguiram desenvolver o Programa de forma a contento;

6 - Outro desafio é o combate as drogas a partir de uma política de promoção social das famílias, onde se junte repressão com promoção social de direitos. Criança e adolescente precisa desde cedo perceberem que tem oportunidade para evitar as drogas como caminho fácil para resolver seus problemas.

7 – É importante uma política estadual de enfrentamento a prostituição infanto-juvenil e para tanto é necessário mapear os pontos de prostituição assim como desenvolver ações concretas com os municípios de fronteiras ou com forte atividade turística;

8 – Na esteira da formação, avançar na operação do direito da criança e do adolescente requer formação permanente dos operadores deste direito em nosso estado. Daremos uma contribuição a este assunto, quando ousamos aprovar e assegurar orçamentariamente uma política de formação permanente dos operadores do direito. Aprovar é importante, mas é essencial a alocação de recursos nos orçamentos públicos para esta finalidade.

9 – É urgente também que o Estado aprofunde a política de contextualização da suas políticas com a realidade do semi-árido baiano, que cobre a maioria de nossos municípios. Conhecer esta região, incentivando estudos e focar políticas públicas contextualizadas é passo significativo para alterar os índices sociais que atingem a criança e o adolescente do nosso semi-árido, conforme as pesquisas que mostram a violação de direito elementar nesta região. Sem dúvida, promover políticas sociais é um dos remédios mais eficazes contra a violência. Assim, criar espaços de lazer, cultura e esportes nos municípios baianos evitará que as crianças e os adolescentes vejam os bares como sua única opção de diversão, como é a realidade atual, principalmente dos bairros mais pobres do nosso Estado. Termos ações concretas de promoção da cultura, esporte e do lazer para criança e adolescente exige-se pensar como utilizar os prédios públicos ociosos, as escolas públicas e os espaços das entidades não governamentais para desenvolver ações de cultura, esporte e lazer que promovam este direito como essencial para o desenvolvimento humano da criança e do adolescente.

10 – Por fim, queremos destacar a necessidade urgente de projetos na área de levantamento de dados sobre a realidade social no estado da criança e do adolescente. Termos estatísticas confiáveis é passo fundamental para focalizar ações e garantir efetividade e eficácia, inclusive com potencialização do fundo público. Fazemos política pública ainda de forma espontânea e por isto desperdiçamos muito tempo e recursos financeiros e humanos. Devemos comprometer as universidades, a Secretaria de Planejamento e a SEI no compromisso de produzir dados sobre a realidade da criança e do adolescente no estado. É claro também que isto não deve dispensar o financiamento de entidades que tem credibilidade no levantamento de dados.

11 – Terminando é urgente que o Governo Estadual encontre uma forma de financiar a estruturação dos Conselhos Tutelares e de Direitos, para que possamos ter estes órgãos funcionando de fato em nosso estado, já que a situação deles é deplorável na maioria dos municípios, onde falta-se questões mínimas para o desempenho da função: um local, linha telefônica, recursos humanos e internet. Entendemos que o governo deve criar uma estratégia de condicionar o repasse de recursos/impostos estaduais a municípios que cumprirem com a responsabilidade de garantir o funcionamento autônomo dos Conselhos Tutelares e Municipais, bem como dos Fundos de Criança e Adolescente, com fundos.

O exposto acima exige-se planejamento. Assim, devemos trabalhar na Elaboração e aprovação do Plano Decenal estadual dos direitos da criança e do adolescente, que seja assumido pelo Poder Público e pela sociedade baiana e que de fato caminhem para garantir o cumprimento do direito da criança e do adolescente no estado. Criança não pode ser futuro, porque este é construção do presente. Criança e adolescente precisa ser presente e presente nos orçamentos públicos.


Antonio Marcos é professor, conselheiro do CECA - BA e Diretor executivo da ONG IDESAB (Juazeiro-BA)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Desenho Universal

Por Cid Torquato . 24.08.10 - 17h05

Universalizando o Desenho Universal

Thank you, Yahoo!, pelo convite e pela tremenda honra que é desenvolver este novo espaço editorial, cujo objetivo é exatamente “universalizar” o Desenho Universal, um conceito que coloca em pauta a discussão sobre diversidade e inclusão.

A princípio usado em relação às dificuldades e necessidades de pessoas com deficiência, o Desenho Universal prega uma visão inclusiva de, na medida do possível, “tudo para todos”, e de, no limite do utópico, “todos para todos”, na construção de um mundo mais diverso e melhor.

Quando andamos pelas ruas, usamos uma cabine telefônica ou nos hospedamos em um hotel nem paramos para pensar que o acesso a esses lugares é condição fundamental para a participação social e a livre circulação dos cidadãos. Quando temos, em vez de escadas, rampas para chegar a um shopping center, sabemos que esse local foi construído de forma universal para que um cadeirante, por exemplo, também possa frequentá-lo. Ser universal é contemplar a todos.

O conceito de Desenho Universal está estabelecido na Lei 10.098/2000 e no Decreto 5.296/2004, com normatização pela Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT, através da NBR 9050. Sua definição legal é: “Uma concepção de espaços, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes características antropométricas e sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções que compõem a acessibilidade.”

O Desenho Universal baseia-se no respeito à diversidade humana e promove a possibilidade de livre movimentação, funcionalidade e acesso a produtos, serviços e comunicação em condições de igualdade.

Os sete princípios do Desenho Universal
Os princípios abaixo podem ser aplicados a tudo o que criamos e produzimos, sejam produtos, serviços, metodologias e sistemas, a saber:

1. Princípio Igualitário – Uso Equiparável: Ser útil a pessoas com capacidades diversas, proporcionando usabilidade a todos.

2. Princípio Adaptável – Uso Flexível: Ser adaptável e adequado a pessoas com diferentes habilidades e preferências individuais.

3. Princípio Óbvio – Uso Simples e Intuitivo: Ser de fácil compreensão, independentemente da experiência, conhecimento do idioma, habilidade, nível de formação e concentração do usuário.

4. Princípio Conhecido – Informação de Fácil Percepção: Quando a informação necessária é transmitida de forma a atender a todos, independentemente do idioma, dificuldades de visão ou audição. A comunicação deve ser eficaz, através de recursos pictográficos, verbais ou táteis.

5. Princípio Seguro – Tolerante ao Erro: Visa minimizar riscos e consequências negativas decorrentes de ações acidentais ou involuntárias.

6. Princípio Esforço Mínimo – Baixo Esforço Físico: Estabelece que o uso deve ser eficiente e confortável, com o mínimo esforço, evitando a fadiga.

7. Princípio Abrangente – Dimensão e Espaço para Aproximação e Uso: Determina que o tamanho e espaço para aproximação, alcance, manipulação e uso sirvam a todos, independente da estatura, tamanho do corpo (obesos, anões etc.), postura ou mobilidade.

Acessibilidade Digital
O conceito de Desenho Universal não passa apenas pela questão arquitetônica e urbanística. Atualmente, uma das questões mais relevantes é a da acessibilidade digital, em páginas da web, programas, aplicativos e interfaces gráficas, em toda a gama de equipamentos que fazem parte da vida contemporânea. A questão é considerar a variedade de contextos de interação, bem como as dificuldades potenciais de uso relacionadas aos diversos tipos de deficiência. Muitas vezes o usuário pode se encontrar nas seguintes situações:

- não ser capaz de ver, ouvir, se mover ou processar certos tipos de informação;

- ter dificuldade de ler ou compreender textos;

- não ser capaz de operar o teclado ou o mouse;

- usar um monitor que não processa imagens ou é pequeno demais;

- não entender com fluência a linguagem do aplicativo;

- estar em uma situação em que o uso dos olhos, dos ouvidos ou das mãos está comprometido;

- usar uma versão do browser e/ou do programa, que não permite acesso ao conteúdo desejado.

É a partir dessas questões que surge a necessidade de desenvolver formatos em que a questão do acesso de todos os usuários, inclusive daqueles com deficiência, esteja garantido. Assim, é absolutamente necessário que, por exemplo, uma página da internet atenda às recomendações de acessibilidade tanto para usuários com computadores comuns quanto para usuários que estejam interagindo a partir de, por exemplo, um sintetizador de voz (para deficientes visuais).

Nesse sentido, o Word Wide Web Consortium (W3C), instituição global que promove padrões de acessibilidade digital, trabalha para universalizar a possibilidade de acesso e uso da internet, assim como de todos os recursos oferecidos pelas tecnologias da informação e comunicação (TICs).

Moral da história

Tendo como pano de fundo os conceitos acima expostos, publicarei quinzenalmente, às terças-feiras, artigos sobre como podemos melhorar nossas vidas colocando o Desenho Universal em prática.

Para o pleno sucesso desta iniciativa, a participação de você, leitor, é fundamental, enviando comentários, críticas, experiências pessoais e sugestões de pauta.

Conto com a colaboração de todos.


Fonte: www.br.yahoo.com

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Pedofilia na internet: falta orientação para crianças e adolescentes

Brasília - O número de usuários da internet no Brasil, incluindo computadores públicos em cybercafes e escolas, é superior a 73 milhões, conforme levantamento feito no último mês de maio pela comScore,Inc (Nasdaq:Scor), que mede os acessos à rede. Crianças e adolescentes de 6 a 14 anos representam 12% desse total e passam a maior parte do tempo em sites de entretenimento, bate-papo ou nas redes sociais, como o Orkut e Facebook – um comportamento virtual que preocupa os pais, principalmente em relação aos crescentes casos de pedofilia.

Desenvolvida durante a Guerra Fria, quando os Estados Unidos e a União Soviética disputavam a hegemonia política, econômica e militar, hoje a internet é protagonista de uma outra guerra - contra a pedofilia, o abuso sexual e a pornografia. Segundo o diretor juridico da organização não governamental (ONG) SaferNet Brasil, Thiago Tavares, ao mesmo tempo em que amplifica o acesso a conteúdos ilegais, a internet também oferece os meios para descobrir e mapear as redes criminosas.

“A internet é a grande aliada para a investigação e descoberta das redes criminosas que veiculam pornografia infantil e desses agressores sexuais que se utilizam da rede para aliciar crianças”, disse Tavares.

Como os pais e educadores lidam com essa nova realidade virtual dos filhos? O uso da internet requer cuidados para garantir a proteção de crianças e adolescentes. O conselho básico que se recebia antigamente para não conversar com estranhos, não vale para o mundo virtual. O estranho está dentro dos lares, na lan house da esquina, na escola e até mesmo em uma simples ligação telefônica.

Com 11 anos, Laís Vieira diz que utiliza a internet para “entrar no Orkut e no Twitter”, hábito seguido por José Henrique Paranhos, que tem a mesma idade e também usa a rede “para ler e-mails e fazer pesquisas escolares”.

A mãe de Lais, Andréa Vieira, afirma que esse controle é dificil, porque os jovens passam muito tempo diante do computador. Ela diz que está sempre atenta sobre quem está na lista da filha nos sites de relacionamento, como o Orkut. “Se eu vejo que tem algum adulto desconhecido, mando deletar. Não quero nem saber quem é . Explico sempre o quanto é importante não conversar com gente desconhecida.”

O Orkut e os chats lideram a lista dos endereços mais perigosos da rede, de acordo com a SaferNet . A ONG possui uma Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos em parceria com o Ministério Público Federal. A maioria delas são relacionadas ao Google.

A CPI da Pedofilia aprovou em 2008 a quebra de sigilo de mais de 3 mil álbuns de fotos publicados no Google. A empresa teve que repassar dados que ajudaram a identificar os responsáveis pelas páginas, por causa da suspeita de conteúdo com pornografia infantil. O Brasil foi pioneiro na quebra desse tipo de sigilo.

De acordo com Thiago Tavares, da SaferNet, não existe nenhuma política pública em vigor no país com foco no combate aos crimes cibernéticos. “Eu estive recentemente no Congresso Nacional a convite da Comissão Parlamentar de Inquérito das Crianças Desaparecidas. Os deputados se comprometeram a colocar essa discussão no âmbito da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Resta saber se vão cumprir essa promessa ou não”, conclui.

Fonte: Agência Brasil, Ana Lúcia Caldas, Edição: Andréa Quintiere - 22/08/2010

Criança Segura: prevenção é amor e atitude

24/08/2010

Dia Nacional da Prevenção de Acidentes com Crianças

O próximo dia 30 de agosto é o Dia Nacional da Prevenção de Acidentes com Crianças, mobilização nacional convocada pela ONG Criança Segura com o objetivo de promover uma maior conscientização e ampliar a discussão sobre o tema.
A proposta é que associações e instituições comunitárias se organizem para desenvolver ações e manifestações públicas ligadas à prevenção. Parte dessas iniciativas, aliás, estão em destaque no site da organização (www.criancasegura.org.br) e na plataforma http://crianca-segura.ning.com/. Não deixe de participar!

Materiais de referência

Diferentes publicações disponibilizadas no Portal Pró-Menino também abordam esse tema. A obra O Livro das Emergências, da jornalista Aline Angeli, é uma excelente sugestão de leitura. Publicado pela Editora Ática, o livro, dirigido ao próprio público infantil, traz uma série de dicas de segurança e de prevenção de acidentes em casa. Confira mais informações aqui.
Além disso, na seção Práticas de Atendimento, está disponível um guia para práticas relacionadas à segurança de crianças e adolescentes, elaborada pelo Instituto Criança é Vida. O documento trata, entre outras questões, da importância de que o lugar onde a criança brinca esteja em boas condições e de mantê-las fora da cozinha. Veja o guia completo aqui.

Fonte: www.promenino.org.br

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Nossas escolhas são nossa ética: antropologia e política no caso Rafael Mascarenhas

Na madrugada de 20 de julho, Rafael Mascarenhas, de 18 anos, filho da atriz
Cissa Guimarães, foi abandonado por Rafael Bussamra, que o atropelou no
Túnel Acústico, na Gávea, interditado na ocasião pela prefeitura para
circulação de carros. O fato chamou atenção do público pela tragédia em si,
mas também pelo episódio de corrupção praticada pela família do atropelador,
que pagou R$ 1 mil a policiais que pararam o carro logo após o acidente.
Essa história aconteceu no Rio de Janeiro e serviu como pano de fundo para o
debate sobre ética que a ONG Junior Achievement promoveu, na semana passada,
com apoio do GLOBO e do EXTRA. Três dos quatro debatedores convidados
fizeram referência ao caso como um exemplo de escolhas éticas com as quais
esbarramos no cotidiano.
"Alguém aqui chamaria a polícia em vez de ligar para os pais?", provocou o
antropólogo Roberto da Matta ao comentar a reação de Bussamra.

- Em qualquer outro país do mundo, a primeira ligação seria para a polícia,
mas aqui, não só não acreditamos na polícia, como há uma prática de subornar
para escapar das regras da lei - disse o antropólogo.
Num contexto mais amplo, a discussão do encontro, mediado pela editora do
Razão Social, Amelia Gonzalez, girou em torno do dilema que enfrentamos para
optar por soluções mais sustentáveis em prol da preservação da vida no
planeta. Foi o tom da fala de Oded Grajew, presidente do Instituto Ethos,
para quem "ética é a forma com que se age, é o que determina nossas
escolhas". Para ele, a questão que se impõe hoje é decidirmos se vamos ou
não acreditar nos cientistas: - Eles nos dizem que, se não mudarmos nossa
forma de viver, a espécie humana corre o risco de ser extinta neste século.
O que está em jogo, então, são os nossos filhos, netos. Hoje, o crescimento
é sem limites e a cultura é da competição. Somos diferentes de outros seres
vivos, a nós foi dada a faculdade de fazer escolhas. E fazer escolha é
ética - disse Grajew.
O antropólogo Roberto da Matta e a mestra em ciência da informação e
fundadora da empresa X-Brasil Marta Porto trouxeram também para o debate
situações em que nos deparamos com nossos limites éticos no cotidiano. Autor
do recém lançado livro "Fé em deus e pé na tabua", Da Matta citou a conduta
no trânsito como exemplo da incoerência praticada pelo brasileiro
diariamente.

- Quando estamos parados no sinal e precisamos, por exemplo, pegar um avião,
achamos que nosso motivo é suficiente para cometer a infração de avançá-lo.
No Brasil não temos falta de ética, mas sim muitas éticas: uma da família,
uma do homem, uma da mulher etc. Não há uma única ética permeando espaços
públicos, como o trânsito, que deixe os indivíduos em igualdade de
condições. Quando alguém respeita a lei, temos que achá-lo um herói e não um
babaca - comentou Roberto Da Matta.
Para ele, a consequência de uma sociedade que convive com tantas éticas
chegou ao limite no caso do atropelamento com morte de Rafael Mascarenhas.
Da Matta diz que o que valeu, neste caso, foi uma ética da família.

- O rapaz que atropelou não ligou para a polícia, mas para o papai e a
mamãe.
O caso também foi emblemático para a jornalista Marta Porto, uma das
criadoras do primeiro escritório da Unesco no Rio de Janeiro. Para ela, o
principal debate dessa história trágica não tem a ver com o pagamento da
propina aos policiais, mas com a ausência de indignação, tanto da família do
atropelador quanto da sociedade.

- Não é a discussão da propina que me interessa. É o silêncio daquele grupo
de pessoas que participou da ação. A escolha ética surge no momento em que,
após atropelar uma pessoa no túnel, opta-se por abandoná-la no local em vez
de fazer algo para que a pessoa não morra e arcar com as consequências. A
possibilidade da ética reside no espaço entre o sujeito pensar e fazer -
disse.
É a falta de sentimentos primários entre os sujeitos que hoje, na opinião
dela, permite que atitudes contrárias ao bem comum sejam praticadas. Marta
diz que atualmente nos faltam "afetos" no sentido de sabermos o que toca
cada um de nós: - Sem sentimento, não há ética. A pessoa precisa ter, em
primeiro lugar, um afeto que pode ser o senso de justiça, a vergonha ou o
remorso. Uma sociedade que perde a sua capacidade de indignação não é capaz
de despertar esses sentimento iniciais e tornase um perigo. Como despertamos
o afeto em uma sociedade que cada vez mais se silencia diante de questões
pequenas, médias e grandes. A passividade, o tédio e o silêncio não são
atitudes éticas. A sociedade brasileira está diante de um desafio que é
tratar as situações com a dimensão afetiva que deveria ter se quiser
realizar mudanças - falou a jornalista.
Oded Grajew acredita, porém, que qualquer movimento de transformação social
deve passar, necessariamente, pelas corporações, já que nelas reside o
poder.

- Quem manda hoje no Brasil são as empresas, por isso qualquer tipo de
mudança tem que passar pelo mundo empresarial. Elas têm recursos
financeiros, tecnológicos e poder político.
Se não mexermos neste sistema, nada vai mudar. O financiamento de campanhas
nas eleições, por exemplo, precisa mudar, pois cerca de 70% a 80% vêm de
caixa dois de empresas que não querem declarar o investimento.
A maioria dos políticos são representantes de empresas que financiam suas
campanhas. Quando são eleitos, não pensam nas necessidades da população mas
em retribuir aos financiadores - apontou Grajew a uma plateia atenta de
cerca 60 pessoas.
O empresário ressaltou ainda que atualmente não faltam ferramentas para uma
empresa agir de maneira ética e sustentável.
Para Grajew, é fundamental que os gestores reflitam a serviço de quê estão
trabalhando e direcionando seus talentos.
Toda decisão deve, antes, ter seu impacto avaliado. Segundo ele, esta
prática deve começar cedo, ainda na escola básica. Por isso, Grajew é
radical ao defender uma mudança curricular para a educação escolar, já que
hoje valores como competição, individualismo, consumo desenfreado e
desconfiança mútua se sobrepõem à prática cidadã.

- Nos aeroportos cheios o que vemos são filas de pessoas, entre elas velhos,
crianças e adultos, esperando para serem revistados. Todos desconfiam de
todos. O "outro" é a maior ameaça.
O sistema de competição nas escolas é o início disso - disse Grajew.
Gilson Maurity, presidente da Lubrizol e diretor da Junior Achievement, vai
além e diz que só a educação pode transformar a sociedade.

- A escola não deveria dar uma formação acadêmica apenas, mas também ética.
O grande movimento de mudança na humanidade vem da relação entre seus
indivíduos e do respeito pela vida humana. A conduta de cada um nada mais é
do que a ética - afirmou Maurity, após destacar que todo o trabalho da
Junior Achievemet segue este princípio.
Com humor, o antropólogo Roberto Da Matta, que é professor da PUC-Rio,
elevou a discussão para a dimensão da condição humana ao citar a obra 'As
you like it'(em português "Como gostais"), de William Shakespeare. A peça
trata da história de Rosalind, uma moça que se traveste de homem para saber
segredos do sexo oposto e, assim, conquistar seu amado. Da Matta lembrou que
o livro traz nas primeiras páginas os seguintes dizeres: "O mundo não foi
feito por nós". Para ele, a frase nos remete à dificuldade de nós, seres
humanos, encontrarmos soluções para os nossos dilemas éticos simplesmente
pelo fato de o planeta nos ter sido dado.

- O mundo é um palco e nós somos atores que têm momentos de entrada e
saída - comentou.
O encontro foi parte do projeto "Vamos Falar de Ética", que a Junior
Achievement desenvolve com jovens do Ensino Médio de escolas estaduais do
Rio de Janeiro. O objetivo do programa é formar uma consciência ética.

A metodologia envolve a promoção de debates e atividades práticas nas
escolas com o intuito de incentivar os jovens a refletir sobre o seu papel
como cidadão. O trabalho já reúne uma equipe de cerca de 400 voluntários e
pretende atingir cinco mil jovens.
Para se inscrever como voluntário: jabrasil.org.br

sábado, 21 de agosto de 2010

Ações afirmativas e avanços sociais

Artigo de Marie-Pierre Poirier, Representante do UNICEF no Brasil e coordenadora-residente interina do Sistema das Nações Unidas no Brasil, publicado no jornal Folha de S. Paulo no dia 4 de abril de 2010.

No decorrer das quatro últimas décadas, o Brasil tornou-se uma das maiores economias do mundo. Com o crescimento econômico caiu o analfabetismo, a população tornou-se predominantemente urbana e o sistema de ensino superior passou por uma grande expansão. De forma geral, as desigualdades diminuíram, como resultado de novas políticas salariais e da criação de políticas universais de transferência de renda, aliadas à expansão industrial do país.

Apesar desses avanços, as disparidades raciais persistem, e em alguns aspectos aumentam. De acordo com análises do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, baseadas nas PNADs de 2001 a 2007, há reduções nas taxas de analfabetismo de mulheres e homens negros e brancos e aumento na média de anos de estudo.

No entanto, as distâncias entre os indicadores dos distintos grupos permanecem, revelando a manutenção das desigualdades raciais. A desigualdade na educação superior é evidenciada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 2008, 20,8% de estudantes brancos de 18 a 25 anos estavam matriculados no ensino superior, enquanto os negros eram apenas 7,7%.

E, entre as pessoas com mais de 25 anos, 14,3% dos brancos, comparados com 4,7% dos negros, tinham concluído o curso superior. Em 2009, o Centro Indígena de Estudos e Pesquisas mostrou que 20% dos cerca de 6.000 estudantes universitários indígenas não concluem seus estudos, o que implica acompanhamento sistemático e medidas de permanência para conter os fatores de evasão.

A persistência das desigualdades de raça e etnia, especialmente no tocante ao ensino superior e, consequentemente, ao acesso às melhores posições e salários do mercado de trabalho, impede a plena realização da democracia e o progresso do país em direção aos seus objetivos de desenvolvimento. Com quase metade da sua população com restrições de acesso à oportunidades equitativas para a ampliação de suas potencialidades, todo o processo de desenvolvimento do país fica prejudicado.

As ações afirmativas são aplicadas por países no mundo inteiro. A África do Sul valeu-se de políticas específicas para diminuir o distanciamento socioeconômico entre negros e brancos após o fim do apartheid. Na Índia, as ações afirmativas foram fundamentais para enfrentar o sistema de castas, na Austrália promoveram a inclusão dos aborígenes e, na Nova Zelândia, dos maoris. Dos Estados Unidos vêm dados animadores: salto de 5,4% de negros formados em universidades e escolas profissionais para 15,5%, entre 1960 e 1990.

O Brasil é signatário de todas as declarações, tratados e acordos internacionais consensuados globalmente para a proteção e promoção dos direitos humanos e do desenvolvimento.

Isso inclui aqueles que versam sobre o combate às desigualdades, desde os mais gerais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), até os mais específicos, como a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1966).

Nessas seis últimas décadas, a maioria dos instrumentos internacionais firmados e ratificados pelo Brasil apresentam as ações afirmativas como estratégias reconhecidas e recomendadas pela ONU para a promoção da igualdade e o combate à discriminação e delineiam as bases conceituais para que as ações positivas de Estado promovam a igualdade.

O Brasil vem se destacando pelos avanços na implementação das recomendações da 3ª ConferênciaMundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância (2001). As iniciativas na política educacional, como a reserva de vagas para afrodescendentes e indígenas em universidades públicas ou privadas, se alinham à agenda positiva de redução das desigualdades e ampliação das oportunidades educacionais para membros de grupos historicamente discriminados e marginalizados.

No país, o Marco Geral de Assistência das Nações Unidas para o Desenvolvimento insere a redução das desigualdades de gênero e raça entre seus cinco temas relevantes. Por isso, a ONU no Brasil reafirma o seu total apoio ao Estado brasileiro e à sociedade civil na aceleração do processo de desenvolvimento nacional por meio da efetivação dos compromissos internacionais assumidos pelo país.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Julgamento Moral e Cívico

27.6.2010 - 21:45h

Por Wilmar Marçal*

A frieza das letras manifestadas por alguns defensores na instância jurídica, data vênia, muitas vezes frustra a população que aguarda um judiciário firme e comprometido com o bem público. Mas é preciso obedecer e acatar, pois, segundo se sabe, é uma análise realizada com a arte e a ciência da razão e não da emoção. Esse viés argumentativo tem tirado muito ladrão da cadeia, absolvido muitos traficantes e amparado pedófilos que são liberados e continuam machucando crianças e famílias.

Essas possibilidades de contar com defensores deve e precisa continuar, pois a todos é permitido a ampla defesa e o contraditório. Lamentavelmente não se pode julgar com a emoção, razão pela qual, talvez, ainda existam muitos problemas sociais no país, pois os atos malditos coadunam com a perpetuação da impunidade. Em outros países, quem comete um erro, morre duas vezes: primeiro de humilhação, depois retirando a própria vida pela falta de dignidade em continuar convivendo com pessoas de bem. Mas no nosso querido Brasil... muitos fazem e acreditam que "não vai dar em nada". Todavia, como diz a própria Constituição Brasileira, "todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido", está na hora de uma reação popular para o exercício prático do bem: sem armas, sem violência e sem lágrimas. Com a mesma frieza que o judiciário é peculiar em suas análises, a população, bem organizada, tem muito mais poder do que qualquer Juiz, data vênia.

Basta querer e se organizar. Sem vaidades, sem trampolins, mas com ordenamento e inteligência. Especificamente sobre os parlamentares "escolhidos" pelo povo, é possível sim avançar e execrar esses bandidos que sempre são reeleitos e se dizem representantes do povo nas respectivas Assembléias. O povo pode legislar com muito mais sapiência, no momento em que mantiver viva a memória de todos, nutrindo a lembrança com a boa informação em jornais e mídia comprometidos, verdadeiramente, com a causa coletiva. Chega dessa conversa fiada de "segredo de justiça" e "blindagem privativa". Bandido é bandido. É preciso destacar, em grande escala, os nomes daqueles que usurpam o dinheiro público, roubam a esperança de muitos e perpetuam a falsa bondade de atender os munícipes, prometendo mirabolantes projetos e recursos. Quem viaja pelo interior do Paraná pode constatar que as cidades estão empobrecidas, com poucos investimentos em infra-estrutura, muita gente desocupada e doente. Cabe-nos como cidadãos e cidadãs uma reação natural e pacífica.

Analise, pense, estude a vida dos candidatos a qualquer cargo público e vote. Vote de acordo com sua inteligência e coerência. Não se pode mais admitir que a população ainda se renda aos hipócritas, mentirosos e mentirosas. Só assim será possível um julgamento moral e cívico que, certamente, não encontrará habeas corpus em qualquer jurisprudência para liberar os pérfidos e os enganadores. Façamos cada um de nós a nossa parte. Vamos ensinar a pescar e parar de assistir algumas pessoas recebendo o peixe de graça.

* Wilmar Marçal é professor universitário e ex-reitor da UEL./Pr

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Desenvolvimento Sustentável e Sociedade Civil

ABONG defende modelo de desenvolvimento sustentável

Para contribuir com o debate de projetos que marca o período eleitoral, a ABONG tem procurado sistematizar suas reflexões sobre as concepções de desenvolvimento que defende desde sua fundação, há dezenove anos atrás. A ideia é formular um documento a partir das discussões feitas nas regionais e em diversas atividades, para pautar com a sociedade as questões consideradas fundamentais pelo campo ao qual pertence.

De forma geral, as organizações, redes e articulações que fazem parte do campo progressista e defensor de direitos no qual a ABONG se inscreve, têm se preocupado em discutir os impactos de um modelo de desenvolvimento extremamente agressivo ao planeta, combinado a um modelo de sociedade cada vez mais voltado para o consumo.

O Brasil se insere nesta perspectiva ao adotar uma série de opções, como o cultivo extensivo de cana-de-açúcar e outros elementos para a produção de álcool combustível em detrimento do cultivo de alimentos, e mais recentemente ao investir na extração de petróleo ao invés de apostar em práticas não agressivas de geração de energia.

A adoção de um modelo de desenvolvimento calcado na construção de grandes obras de infra-estrutura cuja relação custo benefício é terrível para as populações afetadas – caso da hidrelétrica de Belo Monte – e na comercialização em grande escalada de bens como automóveis, graças a incentivos fiscais, deixando as cidades cada vez mais impossíveis ao invés de investir em transporte público, também vai neste sentido.

Há milhares de outros exemplos para ilustrar a situação descrita, que se repete em vários países do mundo, e não só no Brasil. Podemos dizer que a humanidade, ao adotar a direção da não-sustentabilidade, tem trabalhado intensamente para tornar o planeta inabitável ao desmatar grandes florestas para transformá-las em pastagens, deslocar populações para construir grandes barragens e usinas, poluir rios e mares ao despejar esgoto e agrotóxicos etc.

Tudo isso tem contribuído para acelerar os processos de derretimento de geleiras, esgotamento de recursos naturais como a água doce, entre outros que interferem diretamente no regime de chuvas e provocam severas alterações climáticas. A intensificação dos chamados fenômenos naturais, aliada ao descaso com o planejamento urbano das cidades acaba por prejudicar a população pobre que vive em condições de mais vulnerabilidade.

Esse quadro só será revertido a partir de uma transformação estrutural do sistema capitalista, que tem na perpetuação de todos os aspectos acima colocados suas principais características. Se não formos capazes de reverter o atual processo de conversão da vida em mercadoria, condenaremos as futuras gerações à vivenciar a destruição do planeta.

São essas questões que a ABONG pretende pautar nos momentos que antecedem as eleições, chamando a atenção de candidatas e candidatos para a urgência em discutir um outro modelo de desenvolvimento. Paralelamente, a Associação participa também de uma iniciativa proposta por grupos e redes como Gife e Fundação Esquel para pautar questões relacionadas à criação de um marco regulatório para as organizações da sociedade civil junto às/aos presidenciáveis. Esta é outra questão sobre a qual a ABONG tem se debruçado e que merece a atenção de todas e todos interessadas/os no fortalecimento da sociedade civil organizada no Brasil.

Fonte: www.abong.org.br

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Eleições, Mulher, Jornalismo e Ideologia

O que uma mulher precisa para ser presidente do Brasil?

O que exatamente esperamos de uma mulher candidata à Presidência? Que ela tenha conteúdo, mas também seja bonita e se vista de maneira atraente, como a argentina Cristina Kirchner? Ou que tenha um ar mais austero e rígido, como a alemã Angela Merkel? E talvez se ela for religiosa e demonstrar que essa é uma de suas principais referências, como a atual Marina Silva e a então Heloísa Helena, terceiro lugar no pleito de 2006, estaríamos de acordo?

Essas dúvidas surgiram quando assisti, ontem à noite, ao Jornal Nacional, que entrevistou a candidata petista Dilma Rousseff. Afinal, quais exigências fazemos para aceitar que uma mulher dispute esse cargo com chances reais de vitória?

Bem, se depender dos apresentadores William Bonner e Fátima Bernardes, ao que parece temos apenas dois fatores cruciais: saber qual é a referência masculina da candidata e se ela vai adotar uma postura durona. Afinal, foi em torno disso que girou a conversa.

Logo no início, Bonner quis sabe se o eleitor poderia enxergar o presidente Lula como um tutor de Dilma. Sim, talvez ele pensasse que ela, Dilma, precisasse de um. Mas talvez – e pior ainda – a pergunta decorra de uma imagem que insiste em se atrelar à da mulher na política: a da necessidade de um “guia”, um “cérebro”. Ainda mais para concorrer à Presidência! Vide, novamente, Cristina Kirchner.

Para a minha surpresa, nesse ponto a candidata até que se saiu bem da saia justa: evitou o caminho fácil de dizer que era pupila de Lula e reforçou o quanto o admirava e tinha-o como exemplo. Mas no segundo quesito, tanto a pergunta quanto a resposta foram qualquer coisa de decepcionante. Fátima Bernardes partiu do pressuposto de que Dilma tinha um temperamento “duro e difícil” e questionou-a se ela manteria este perfil durante um possível governo. Dilma disse que essa era uma visão construída a respeito dela, que ela era apenas “firme”. Fátima insistiu:

“– O próprio presidente Lula, este ano em discurso durante uma cerimônia de posse de ministros, ele chegou a dizer que achava até natural haver queixas contra a senhora, mas que ele recebeu na sala dele várias pessoas, colegas, ex-ministros, ministros, que iam lá se queixar que a senhora os maltratava.”

Pressionada, Dilma afirmou o que eu não queria ouvir: “– Olha, Fátima, é o seguinte, no papel, sabe dona de casa? No papel de cuidar do governo é meio como se a gente fosse mãe, tem uma hora que você tem de cobrar resultados”.

À acusação de que era rígida demais, Dilma respondeu que era como uma mãe educando. No lugar de assumir seu papel de candidata, colocou-se como uma mulher no seio da família, que faria o que precisasse para manter a prole em ordem. Uma fuga da postura teoricamente masculina – e que portanto não se encaixaria numa mulher – para a feminina, quiçá na tentativa de enternecer os telespectadores e a dupla que a metralhava.

Mal posso esperar para ver o que perguntarão aos outros candidatos. No mínimo será uma experiência antropológica para discernirmos se o que ocorreu ontem foi jornalismo, ideologia ou preconceito contra mulher. Ou tudo junto, com um pouco menos de carga no primeiro item.


Escrito por Maíra Kubík Mano às 00h55

domingo, 8 de agosto de 2010

A invenção da vida: Festival Literário de Paraty

Ferreira Gullar

Gullar arrebatou a platéia. Foi um verdadeiro showman, com gestos largos, olhar faiscante e puro magnetismo. “A arte existe porque a vida só não basta”. “A poesia é a descoberta e a invenção da vida”. Frases como essas foram aplaudidas com entusiasmo enorme pela platéia. Gullar falou de sua carreira, auxiliado pelo mediador Samuel Titan Jr.E foi tirando do bolso uma anedota melhor do que a outra, sempre com alguma lição existencial embutida. Falou de suas experiências com o neoconcretismo, do início parnasiano, da forte militância política, e de pintura. Leu trecho de seu Poema Sujo, quando foi ovacionado, e também trechos do novo Em Alguma Parte Alguma. E falou, com seu jeito jovial, divertido, sobre a origem de tudo: “Como pode haver a explosão do Big Bang, se antes não havia nada? Nada não explode, ora.” Gullar também participou, duas horas antes, da bela leitura conjunta do livro Alguma Poesia de Drummond, que juntou ainda os poetas Eucanaã Ferraz, Chacal e Antonio Cícero.

Crumb distribui autógrafos

A origem da vida também é um assunto que cativou outro grande convidado da Flip, mas de maneira bem diferente, através da…Bíblia! Robert Crumb subiu ao palco com o amigo Gilbert Shelton e colocou a mão sobre os olhos, ao mesmo tempo fazendo graça e tentando entender o que aquela multidão estava fazendo ali. Falou então de seu Gênesis, de como pensou inicialmente em fazer uma sátira e como logo percebeu que as histórias eram tão estranhas que poderiam ser ilustradas literalmente. Curiosamente, disse que ao lançar o livro, foi mais atacado por seus antigos fãs do que pela direita religiosa. Meio tímido, Shelton falou pouco. Disse que fez ilustrações para jornais de esquerda, porque eram muito chatos. Crumb, por sua vez, parecia estar se divertindo, se jogava para trás na cadeira, espalhafatosamente, e deu um ou dois gritos. Sua mulher, Aline Kominky-Crumb juntou-se à conversa e entregou alguns segredos do casal. Como não podia deixar de ser, o assunto bundas veio à tona. Crumb, um fervoroso devoto dessa parte da anatomia, disse estar bem atento às brasileiras.

Terry Eagleton, em dois momentos

Na primeira mesa do dia, um dinâmico Eagleton acordou todo mundo com sua argumentação tão lógica quanto desconcertante. Como o esperado, criticou a posição de Richard Dawkins e Christopher Hitchens, os quais, para ele, não entendem o sentido das religiões. Ateu como seus adversários intelectuais, Eagleton acredita que o 11 de setembro colocou Deus de novo em evidência, e que é preciso saber separar os radicais dos religiosos comuns. Para ele, a forma como Dawkins e cia atacam o fundamentalismo islâmico é muito próxima da islamofobia. Irônico o tempo inteiro, chegou a dizer que o futebol é o ópio do povo (mas se retratou, rindo) e deu uma breve e curiosa aula de marxismo. Foi das mesas mais interessantes da Festa, deixando muita gente com o que pensar.

Iralndês como Eagleton, e com um livro também ligado ao mencionado 11 de setembro, Colum McCann conversou com o descendente de irlandeses William Kennedy. Amigos há algum tempo, discorreram sobre os pontos comuns de seus livros, que não raro contam histórias de personagens à margem da sociedade. Kennedy falou bastante do festejado Ironweed e da adaptação feita para o cinema juntamente com Hector Babenco, e McCann contou de suas pesquisas no submundo do Bronx, com protsitutas, viciados e policiais, para compor o amplo quadro de seu livro mais recente, Deixe o Grande Mundo Girar, merecidamente vencedor do National Book Award, nos EUA.. Ah, os belos desenhos são de Alexandre Benoit!

sábado, 7 de agosto de 2010

Cultura Livre: uma libertação que virá por osmose ?

Por Toni Carvalho


A globalização parece ser a atmosfera perfeita para manter o dilúvio informacional no qual estamos mergulhados. O artista especializado em cibernética e telemática Roy Ascott, cunhou o termo afirmando que vivemos o segundo dilúvio, o dilúvio da informação. Acrescento que não é de hoje que esquadras mercantilistas que comercializam a informação povoam o oceano formado por esse dilúvio, também não é de hoje que piratas e suas facilidades sedutoras, travam com eles uma batalha desleal – não para todos – que está longe de acabar.

A metáfora do dilúvio informacional, é sabiamente explorada por Lévy em “Cibercultura” (Editora 34, 1999) quando ele afirma que “no oceano formado por esse dilúvio não existe apenas uma arca”. Faço aqui outro acréscimo, afinal, como sabemos dentre tantas arcas reclamadas por Lévy, algumas vêm nos revelando ótimas surpresas como uma alternativa aos mercantilistas e aos piratas: A da cultura livre.

“Cultura é considerada uma das duas ou três palavras mais complexas de nossa língua”. A afirmação de Terry Eagleton (Unesp, 2005, p 9), vem sendo corroborada a cada nova criação que tenta expandir, “reinventar” ou disseminar culturas. Atualmente é crescente a idéia de que essa disseminação deve ter uma liberdade quase sem limites.

Lembrando algumas iniciativas

Foram cunhados diversos termos que fazem parte do universo da cultura livre como o “copyleft”, trocadilho relacionado ao termo copyright (direito de cópia). Graças à alta capacidade de voluntários que vem aumentando essa rede de produtores, escritores, artistas e tantos outros profissionais, que se empenham para produzir conteúdos e produtos livres, a palavra gratuidade está cada vez mais se desvinculando de rótulos que atestam má qualidade ou que de uma maneira ou de outra depreciam sua imagem. O aumento dessa rede pode ser percebido por exemplo no crescimento acelerado de fóruns de discussão na internet, onde muitos deles participam.

Fora a mídia ou rede social do ano (ou do mês) estão também iniciativas como a certificação Creative Commons e a enciclopédia virtual Wikipedia. Mais recentemente ganhou destaque em algumas mídias a iniciativa da Journal Registry Company, uma rede de 18 websites e jornais nos Estados Unidos, eles não apenas estão adotando exlusivamente ferramentas livres e de código aberto para a produção diária, como farão o mesmo com a metodologia usada na construção das pautas. Com isso a reunião de pauta não será apenas no início da manhã cheia de bocejos e muito café, será muito maior, on-line e aberta. Difícil dizer se dará certo, mas parece ser um precedente importante para o que está por vir.

Existem vários fatores que nos levam em direção a esse cenário que se instala, como por exemplo a necessidade crescente de alternativas mais baratas para a aquisição de tecnologias da informação e comunicação (TIC). O dilúvio informacional não é uma simples fase, ele teve e terá mais e mais fases como as três ultimas que vivenciamos, “a convergência das mídias, na coexistência com a cultura de massas e a cultura das mídias”, que segundo Santaella (Paulus, 2003), estão “coexistindo”.

Utopia?

Sim, talvez seja utópico e exagerado querer ver cada consumidor produzindo conhecimentos em esferas como a cibernética e sua rede de “não lugares”, afinal, as redes estarão lá para preencher lacunas e criar algumas se necessário for. Essa liberdade não é nova, ela tem seu conceito disseminado há muito tempo, mas parece que faltava uma base fundamental, já que não há como ter liberdade para expressar-se sem que essa não coexista com a liberdade de criação e disseminação. Ao contrário do primeiro dilúvio, este dificilmente cessará, já que sua fonte parece ser inesgotável. Sobre o termo “libertação”, para muita gente ele cabe como uma luva quando se discute a cultura livre. Tudo que está em curso é difícil de ser analisado com a devida precisão, é um cenário complexo, e terá desdobramentos que dependem do que fazemos a todo instante, e me refiro a todos nós...

REFERÊNCIAS

EAGLETON, Terry. A idéia de cultura. Tradução de Sandra Castello Branco. São Paulo: Editora UNESP, 2005

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, SP: Edições Loyola, 1999.

SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: Da cultura das mídias a cibercultura. São Paulo:


Toni Carvalho é escritor, comunicólogo (UNEB) e radialista da Rádio Comunitária Valente FM (Valente - BA)