A globalização parece ser a atmosfera perfeita para manter o dilúvio informacional no qual estamos mergulhados. O artista especializado em cibernética e telemática Roy Ascott, cunhou o termo afirmando que vivemos o segundo dilúvio, o dilúvio da informação. Acrescento que não é de hoje que esquadras mercantilistas que comercializam a informação povoam o oceano formado por esse dilúvio, também não é de hoje que piratas e suas facilidades sedutoras, travam com eles uma batalha desleal – não para todos – que está longe de acabar.
A metáfora do dilúvio informacional, é sabiamente explorada por Lévy em “Cibercultura” (Editora 34, 1999) quando ele afirma que “no oceano formado por esse dilúvio não existe apenas uma arca”. Faço aqui outro acréscimo, afinal, como sabemos dentre tantas arcas reclamadas por Lévy, algumas vêm nos revelando ótimas surpresas como uma alternativa aos mercantilistas e aos piratas: A da cultura livre.
“Cultura é considerada uma das duas ou três palavras mais complexas de nossa língua”. A afirmação de Terry Eagleton (Unesp, 2005, p 9), vem sendo corroborada a cada nova criação que tenta expandir, “reinventar” ou disseminar culturas. Atualmente é crescente a idéia de que essa disseminação deve ter uma liberdade quase sem limites.
Lembrando algumas iniciativas
Foram cunhados diversos termos que fazem parte do universo da cultura livre como o “copyleft”, trocadilho relacionado ao termo copyright (direito de cópia). Graças à alta capacidade de voluntários que vem aumentando essa rede de produtores, escritores, artistas e tantos outros profissionais, que se empenham para produzir conteúdos e produtos livres, a palavra gratuidade está cada vez mais se desvinculando de rótulos que atestam má qualidade ou que de uma maneira ou de outra depreciam sua imagem. O aumento dessa rede pode ser percebido por exemplo no crescimento acelerado de fóruns de discussão na internet, onde muitos deles participam.
Fora a mídia ou rede social do ano (ou do mês) estão também iniciativas como a certificação Creative Commons e a enciclopédia virtual Wikipedia. Mais recentemente ganhou destaque em algumas mídias a iniciativa da Journal Registry Company, uma rede de 18 websites e jornais nos Estados Unidos, eles não apenas estão adotando exlusivamente ferramentas livres e de código aberto para a produção diária, como farão o mesmo com a metodologia usada na construção das pautas. Com isso a reunião de pauta não será apenas no início da manhã cheia de bocejos e muito café, será muito maior, on-line e aberta. Difícil dizer se dará certo, mas parece ser um precedente importante para o que está por vir.
Existem vários fatores que nos levam em direção a esse cenário que se instala, como por exemplo a necessidade crescente de alternativas mais baratas para a aquisição de tecnologias da informação e comunicação (TIC). O dilúvio informacional não é uma simples fase, ele teve e terá mais e mais fases como as três ultimas que vivenciamos, “a convergência das mídias, na coexistência com a cultura de massas e a cultura das mídias”, que segundo Santaella (Paulus, 2003), estão “coexistindo”.
Utopia?
Sim, talvez seja utópico e exagerado querer ver cada consumidor produzindo conhecimentos em esferas como a cibernética e sua rede de “não lugares”, afinal, as redes estarão lá para preencher lacunas e criar algumas se necessário for. Essa liberdade não é nova, ela tem seu conceito disseminado há muito tempo, mas parece que faltava uma base fundamental, já que não há como ter liberdade para expressar-se sem que essa não coexista com a liberdade de criação e disseminação. Ao contrário do primeiro dilúvio, este dificilmente cessará, já que sua fonte parece ser inesgotável. Sobre o termo “libertação”, para muita gente ele cabe como uma luva quando se discute a cultura livre. Tudo que está em curso é difícil de ser analisado com a devida precisão, é um cenário complexo, e terá desdobramentos que dependem do que fazemos a todo instante, e me refiro a todos nós...
REFERÊNCIAS
EAGLETON, Terry. A idéia de cultura. Tradução de Sandra Castello Branco. São Paulo: Editora UNESP, 2005
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, SP: Edições Loyola, 1999.
SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: Da cultura das mídias a cibercultura. São Paulo:
Toni Carvalho é escritor, comunicólogo (UNEB) e radialista da Rádio Comunitária Valente FM (Valente - BA)
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